terça-feira, 18 de maio de 2010

Projeto Ficha Limpa



Luiz Holanda



O projeto de iniciativa popular, que o povo, jocosamente, apelidou de Ficha Suja, foi aprovado pela Câmara dos Deputados e enviado ao Senado para a sua conclusão final.
A proposta obteve quase dois milhões de assinaturas, proibindo a candidatura de político condenado por crimes contra o patrimônio público e outros delitos nele mencionados. De acordo com a proposição, não podem disputar as eleições pessoas condenadas em decisão colegiada (que envolve a opinião de mais de um juiz) por crimes de corrupção, abuso de poder econômico e outras fraudes, abrangendo até os magistrados ou membros do Ministério Público afastados por sanção disciplinar. Os crimes em questão são os considerados dolosos, com intenção de cometê-los, querendo ou prevendo o seu resultado.
Tais crimes - que podem tornar inelegíveis os postulantes a cargos públicos eletivos- são os que preveem penas superiores a dois anos de prisão. O projeto também permite a suspensão dos direitos políticos dos candidatos condenados, fixando em oito anos o prazo em que os mesmos devem ficar fora das disputas eleitorais.
O problema é que, se convertido em lei (ou mesmo antes disso), alguém venha a contestá-lo como inconstitucional, já que nossa Lei Maior estabelece o princípio da presunção de inocência aos acusados em geral, de forma que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Em outras palavras, não se pode punir nem cassar os direitos políticos das pessoas até que se esgotem todas as instâncias. O próprio Supremo Tribunal Federal-STF decidiu recentemente que “A existência de inquérito e de ações penais em andamento contra o Apelante não é suficiente, no caso concreto, para configurar os maus antecedentes, tendo em vista que sequer é possível saber por quais crimes está respondendo”.
Como essa, outras decisões confirmam o princípio constitucional da presunção de inocência até final decisão. A Lei Complementar 64/90, também resultante da iniciativa popular, estabelece as hipóteses de inelegibilidades como forma de proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício do mandato com base na análise da vida pregressa do candidato.
Bastava essa lei ser aplicada pelo Judiciário para  impedir a candidatura dos maus políticos, Como isso não acontece, o povo, desesperado, tenta mudar essa lei com outra lei, pressionando o Legislativo a atuar em nome da moralidade política e administrativa.
Ora, os chamados fichas-sujas já se manifestaram para que o projeto não seja convertido  em lei ainda neste ano, facilitando assim sua continuidade nos cargos atualmente ocupados, imunes a qualquer procedimento judiciário. E é justamente o que querem esses fichas-sujas, assim como os demais funcionários públicos federais, que, por sinal prestam –com as exceções que confirmam a regra- péssimo serviço público, embora recebam uma fortuna para não trabalhar.
Veja-se o exemplo da Bahia, onde funcionários do Judiciário recebem salário de mais de R$ 50.000,00 por mês, e ainda entram em greve por maiores salários.Também ameaçam a continuidade da paralisação se não derem o aumento que pleiteiam, que pelo visto pode chegar, para alguns, a R$100.000,00 mensais.
Mas voltando à discussão constitucional do projeto em questão, o conflito entre o princípio da inocência e o princípio da representatividade popular impulsionará o Judiciário a dizer qual a dosagem a ser aplicada aos dois, gerando ainda mais os contraditórios julgamentos e as inúmeras injustiças cometidas em suas decisões.
E é justamente essa dosagem que poderá impedir que alguns inocentes não sejam prejudicados por processos propostos por  seus adversários ou inimigos. Seja como for, a aplicação dessa lei não vai ser pacífica. Talvez, como outras leis, jamais seja aplicada.

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